sexta-feira, 5 de junho de 2009

Não sentir apenas

"As coisas e as pessoas que fazem parte da minha vida vão aos poucos entrando em mim, depois de algum tempo já não sei dizer o que é meu e o que é delas. Mesmo assim, bem no fundo, há coisas que são só minhas. E embora me assustem às vezes, é delas que mais gosto. Como essa vontade de acabar com tudo, que me dá de vez em quando."
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Não te tocar, não pedir um abraço, não pedir ajuda, não dizer que estou ferido, que quase morri, não dizer nada, fechar os olhos, ouvir o barulho do mar, fingindo dormir ,que tudo está bem, os hematomas no plexo solar, o coração rasgado, tudo bem..."

Pequenas coisas.

"...quando passo por lá assim rapidamente, numa tarde como a de ontem ou outras iguais destes tantos meses passados, penso se não deveria retomá-la, essa rua, essa caminhada, mas sem ele agora- uma tarde, noite ou manhã quaisquer para refazer o percurso inverso atá a casa dele, onde nem mora mais. E parado naquela esquina feito espião, contemplar a sacada daquele décimo andar onde costumávamos nos debruçar abraçados para olhar aquela rua lá embaixo sendo aos poucos coberta pelas sombras da tarde furando a copa-túnel das árvores. As sombras que crescem devagar sobre o asfalto quente do verão passado. As sombras, enfim."
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"Engraçado, não gosto do meu quarto - das paredes, dos móveis -, mas gosto demais das coisas que posso ver pela janela. Das coisas que estão fora dele, porque o que está aqui dentro eu acho muito parecido comigo. E eu não gosto de mim."

Trechos...

"...temo que seja outra vez aquela coisa piedosa, faminta, as pequenas-esperanças, mas quando desvio meu olho do teu, dentro de mim guardo sempre teu rosto e sei que por escolha impossível recuar para não ir até o fim e o fundo disso que nunca vivi antes e talvez tenha inventado apenas para me distrair nesses dias..."

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"Porque você não pode voltar atrás no que vê. Você pode se recusar a ver, o tempo que quiser: até o fim de sua maldita vida, você pode recusar, sem necessidade de rever seus mitos ou movimentar-se de seu lugarzinho confortável. Mas a partir do momento em que você vê, mesmo involuntariamente, você está perdido: as coisas não voltarão a ser mais as mesmas e você próprio já não será o mesmo."
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Não que estivesse triste, só não compreendia o que estava sentindo"

Que seja doce.

"Então, que seja doce. Repito todas as manhãs, ao abrir as janelas para deixar entrar o sol ou o cinza dos dias, bem assim, que seja doce. Quando há sol, e esse sol bate na minha cara amassada do sono ou da insônia, contemplando as partículas de poeira soltas no ar, feito um pequeno universo; repito sete vezes para dar sorte: que seja doce que seja doce que seja doce e assim por diante. Mas, se alguém me perguntasse o que deverá ser doce, talvez não saiba responder. Tudo é tão vago como se fosse nada."

LINDA, UMA HISTÓRIA HORRÍVEL

Que idade ela tem? ele perguntou. Que esse era o melhor jeito de chegar ao fundo: pelos caminhos transversos, pelas perguntas banais. Por trás do jeito azedo, das flores roxas do robe.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Fragmentos de Caio

Eu conheci razoavelmente bem Clarice Lispector. Ela era infelicíssima, Zézim. A primeira vez que conversamos eu chorei depois a noite inteira, porque ela inteirinha me doía, porque parecia se doer também, de tanta compreensão sangrada de tudo. Te falo nela porque Clarice, pra mim, é o que mais conheço de GRANDIOSO, literariamente falando. E morreu sozinha, sacaneada, desamada, incompreendida, com fama de "meio doida”. Porque se entregou completamente ao seu trabalho de criar. Mergulhou na sua própria trip e foi inventando caminhos, na maior solidão. Como Joyce. Como Kafka, louco e só lá em Praga. Como Van Gogh. Como Artaud. Ou Rimbaud.É esse tipo de criador que você quer ser? Então entregue-se e pague o preço do pato. Que, freqüentemente, é muito caro. Ou você quer fazer uma coisa bem-feitinha pra ser lançada com salgadinhos e uísque suspeito numa tarde amena na CultUra, com todo mundo conhecido fazendo a maior festa? Eu acho que não. Eu conheci / conheço muita gente assim. E não dou um tostão por eles todos. A você eu amo. Raramente me engano.

Carta aos pais Caio F.

São Paulo, 12 de agosto de 1987.
Querida mãe, querido pai,Não sei mais conviver com as pessoas. Tenho medo de uma casa cheia de pais e mães e irmãos e sobrinhos e cunhados e cunhadas. Tenho vivido tão só durante tantos – quase 40 – anos. Devo estar acostumado.
Dormir 24 horas foi a maneira mais delicada que encontrei de não perturbar o equilíbrio de vocês – que é muito delicado. E também de não perturbar o meu próprio equilíbrio – que é tão ou mais delicado.Estou me transformando aos poucos num ser humano meio viciado em solidão. E que só sabe escrever. Não sei mais falar, abraçar, dar beijos, dizer coisas aparentemente simples como “eu gosto de você”. Gosto de mim. Acho que é o destino dos escritores. E tenho pensado que, mais do que qualquer outra coisa, sou um escritor. Uma pessoa que escreve sobre a vida – como quem olha de uma janela – mas não consegue vivê-la.
Amo vocês como quem escreve para uma ficção: sem conseguir dizer nem mostrar isso. O que sobra é o áspero do gesto, a secura da palavra. Por trás disso, há muito amor. Amor louco – todas as pessoas são loucas, inclusive nós; amor encabulado – nós, da fronteira com a Argentina, somos especialmente encabulados. Mas amor de verdade. Perdoem o silêncio, o sono, a rispidez, a solidão. Está ficando tarde, e eu tenho medo de ter desaprendido o jeito. É muito difícil ficar adulto.
Amo vocês, seu filho,Caio.

ps; Uma pequena homenagem, a esse pequeno- monstro que amo tanto.

Ainda não consigui morrer

Tão próxima da minha a cara do meu horror de verme vivo, seria fácil ir com ela. Mergulhar em alívio no buraco negro meu de bicho vil, no meu pedantismo de animal aculturado. Para sempre ir. Para o outro lado, onde? Eu não quis. Ou foi Deus que não deixou? Não era hora ou Deus nem tem nada a ver com isso ou qualquer outra coisa, e sequer existe. Não sei. Sei, sem dúvida, que a vi. Depois, emergindo do coma artificial da morfina, cateteres enfiados nas veias, nunca mais a vi. Pelos corredores sangrentos das CTIs, pelos brancos labirintos hospitalares, empurrando macas, fazendo curativos, em nenhum lugar estava mais. Desapareceu. Não temo que volte um dia. E voltará, sina de todo o humano. E sei, sabemos perfeitamente que é essa cara nossa de cada dia, sempre à espreita. Alguém-Ninguém parece despertar. Como se chamava? Pergunta. Respondo em voz tão baixa que nem sei se chego a falar. Nem é preciso.

No vácuo de mim

(Silêncio)
- Por favor.
- Por favor o que?
- Não se mate.
- Ah, esquece. O sol está indo embora. Só falta um terço dele.
- Ninguém se mata por amor.
- Agora só tem uma lasquinha dele, bem vermelhinha.
- Olha, uma vez eu li um cara, um escritor chamado Cesare Pavese, que dizia assim: “Ninguém se suicida por amor. Suicida-se porque o amor, não importa qual seja, nos revela na nossa nudez, na nossa miséria, no nosso estado desarmado, no nosso nada.”
- E o que aconteceu com ele, esse tal Cesare?
- Se matou.
(Silêncio)

Desespero

No vácuo de mim eu me despenco. Porque seria preciso também abdicar de mim mesmo para novamente reconstruir-me. Tornar a escolher os gestos, as palavras, em cada momento decidir qual dos meus eus assumir. Já esfacelei meu ser, já escolhi as porções que me são conveninentes esquecendo deliberado as outras. E são elas - serão elas? - que agora se movimentam revoltadas, pedindo passagem em gritos mudos, na ânsia de transcender limites, violentar fronteiras, arrebentando para a manhã de sol. O tremular da chama é um aceno, convite para chegar à verdade última e íntima de cada coisa.Não quero. Não posso restar nu, despojado de mim mesmo. Não posso recomeçar porque tudo soaria falso e inútil. As minhas verdades me bastam, mesmo sendo mentiras. Não é mais tempo de reconstruir.Em luta, meus ser se parte em dois. Um que foge, outro que aceita. O que aceita diz: não. Eu não quero pensar no que virá: quero pensar no que é. Agora. No que está sendo. Porque pensar no que ainda não veio é fugir, buscar apoio em coisas externas a mim, de cuja a existência não posso duvidar porque não a conheço. Pensar no que está sendo, ou antes, não, não pensar, mas enfrentar e penetrar no que está sendo é coragem. Pensar é fuga: aprender subjetivamente a realidade de maneira a não assustar. Entrar nela significa viver.Sôfrego, torno a anexar a mim esse monólogo rebelde, essa aceitação ingênua de quem não sabe que viver é, constantemente, construir, não derrubar. De que não sabe que esse prolongado construir implica em erros, e saber vivier implica em não valorizar esses erros, ou suavizá-los, distorcê-los ou mesmo eliminá-los para que o restante da construção não seja abalado. Basta uma pausa, um pensamento mais prolongado para que tudo caia por terra. Recomeçar é doloroso. Faz-se necessário investigar novas verdades, adequar novos valores e conceitos. Não cabe reconstruir duas vezes a mesma vida numa única existência. Por isso me esquivo, deslizo por entre as chamas do pequeno fogo, porque elas queimam. E queimar também destrói…“

Além do ponto

Chovia, chovia, chovia e eu ia indo por dentro da chuva ao encontro dele, sem guarda-chuva nem nada (…) tudo que eu andava fazendo e sendo eu não queria que ele visse nem soubesse, mas depois de pensar isso me deu um desgosto porque fui percebendo, por dentro da chuva, que talvez eu não quisesse que ele soubesse que eu era eu, e eu era. Começou a acontecer uma coisa confusa na minha cabeça, essa história de não querer que ele soubesse que eu era eu, encharcado naquela chuva toda que caía, caía, caía e tive vontade de voltar para algum lugar seco e quente, se houvesse, e não lembrava de nenhum, ou parar para sempre ali mesmo naquela esquina cinzenta que eu tentava atravessar sem conseguir, mas eu não podia, ou podia mas não devia, ou podia mas não queria ou não sabia mais como se parava ou voltava atrás, eu tinha que continuar indo ao encontro dele, que me abriria a porta, o sax gemido ao fundo e quem sabe uma lareira, pinhões, vinho quente com cravo e canela, essas coisas do inverno, e mais ainda, eu precisava deter a vontade de voltar atrás ou ficar parado, pois tem um ponto, eu descobria, em que você perde o comando das próprias pernas.

Sem ùltimas esperanças...

Sei lá, que eu ando. Muito triste. Uma merda, tudo isso. Mas não importa, não me interrompa agora. Deixa eu falar, por favor, deixa eu falar. Tem uma coisa dentro de mim que continua dormindo quando eu acordo, lá longe de mim. (…) agora vou ter que voltar a pé para casa mas que importa, volto a pé mesmo, pode ser até que acorde um pouco e aquela coisa lá longe volte pra perto de mim**

Esses dias... frios

Tá eu vou tentar, prometo que vou tentar descrever aqui com minhas palavras esse momento da minha vida. Algumas pessoas não entendem que cada um tem seus ciclos, fases, enfim não importa como se chame, mas são pedaços de você, da sua vida. O meu mundo tá fechado pra visitasão, tá nublado, não sei quanto tempo ainda vou ficar, continuar assim, continuo gostando das mesmas coisas, das mesmas pessoas, das musicas de sempre.
Não é por que estou mais off, que amo menos tudo que me cerca. Preciso de um tempo, desse tempo, esvaziar os poros, limpar as saidas de emergência, recolher os entulhos e me reconstruir. Não preciso prvar nada pra ninguém... ando meio irritado com algumas coisas e me sinto no direito de responder, não tenho a menor intenção de ser simpático a certas pessoas e ponto.
Dizem que me escondo atrás das coisas que o Caio F. escreve, enganam-se , me encontro e não uso isso como escudo, como forma de proteção. E sim pra dizer muitas coisas que não consigo por medo, insegurança ou por tormentos internos, mas de qualquer forma não vou mudar, não mesmo. Meu coração dizem que está sangrando, sim realmente está, mas por favor vez em quando me deixem só, eu-comigo-mesmo. Eu preciso aprender a ser só.
Não consigo escrever mais nada, to com muita mas muita vontade de chorar, mas hesito, vou sair
preciso de ar puro e de alguns cigarros. Porque o silêncio e a imobilidade foram dois dos jeitos menos dolorosos que encontrei, nesse tempo, para ocupar meus dias**
Devia ser sábado, passava da meia-noite. Ele sorriu para mim. E perguntou:
- Você vai para a Liberdade?
- Não, eu vou para o Paraíso
.Ele sentou-se ao meu lado. E disse.
- Então eu vou com você.

Outra vez...

Eu sei que já disse isso mas repito por gosto de felicidade; quero a mesma coisa de novo e de novo.

Espaço em branco

"Sai correndo no parque e me joguei na água gelada de agosto, invadi sem ter direito a névoa dos canteiros, destaquei meu corpo contra a madrugada, esmaguei flores não nascidas, apertei meu peito na laje fria do cimento, a névoa e eu, o parque e eu, a madrugada e eu, costurado na noite cerzido no escuro porque me dissolvia à medida em que me integrava no ser do parque, e me desintegrava de mim mesmo, preenchendo espaços, aqueles enormes espaços brancos, terrivelmente brancos e você não teve olhos para ver que o parque era você, a água era você, a névoa você ,a madrugada você, as flores você, os canteiros você, o cimento você”

M...

Já não sei dizer se ainda sei sentir
O meu coração já não me pertence
Já não quer mais me obedece
Parece agora estar tão cansado quanto eu.
**
Até pensei que era mais por não saber
Que ainda sou capaz de acreditar.
Me sinto tão só
E dizem que a solidão até que me cai bem
**
Às vezes faço planos
Às vezes quero ir
Para algum país distante e
Voltar a ser feliz.
**
Já não sei dizer o que aconteceu
Se tudo que sonhei foi mesmo um sonho meu
Se meu desejo então já se realizou
O que fazer depois
Pra onde é que eu vou?
**
Eu vi você voltar pra mim.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Vai passar???

Inconscientemente, parecia querer buscar em autores, filmes e músicas, algum tipo de consolo. Como se alguém precisasse chegar bem perto do sofá, onde estava, colocar um das mãos em seu ombro e dizer que aquilo era normal. Que acontecia também com outras pessoas. E que iria passar.

...

Está tudo planejado:
se amanhã o dia for cinzento,
se houver chuvase houver vento,
ou se eu estiver cansado dessa antiga melancolia
cinza fria
sobre as coisas conhecidas pela casa
a mesa posta e gasta
está tudo planejado
apago as luzes, no escuro
e abro o gás de-fi-ni-ti-va-men-te
ou entãovisto minhas
calças vermelhas
e procuro uma festa
onde possa dançar rockaté cair".

Os dias.....

A cada dia viver me esmaga com mais força.

Quase sem sentir

As manhãs são boas para acordar dentro delas, beber café, espiar o tempo. Os objetos são bons de olhar para eles, sem muitos sustos, porque são o que são e também nos olham, com olhos que nada pensam. Desde que o mandei embora, para que eu pudesse enfim aprender a grande desilusão do paraíso, é assim que sinto: quase sem sentir.

Aniversario .... M.... uma pequena nobreza atrasada.

Cansado, cansado. Quase não dormi. E não consigo tirar você da cabeça. Estou te escrevendo porque não consigo tirar você da cabeça. Hesito em dizer qualquer coisa tipo me-perdoe ou qualquer coisa assim. Mas quero te contar umas coisas. Mesmo que a gente não se veja mais. Penso em você, penso em você com força e carinho. Axé.Te escrevo por absoluta necessidade. Não conseguiria dormir outra vez se não te escrevesseFiz fantasias. No meu demente exercício para pisar no real, finjo que não fantasio. E fantasio, fantasio. Até o último momento esperei que você me chamasse pelo telefone. Que você fosse ao aeroporto. Casablanca, última cena. Todas as cartas de amor são ridículas. Esse lugar confuso de que fala Caetano. E eu estava só começando a entrar num estado de amor por você. Mas não me permiti, não te permiti, não nos permiti. Alguém me dizendo no ouvido “nunca vi essas luz nos seus olhos.
Fico tomado de paixão. Há tempos não ficava.
Estou te querendo muito bem neste minuto. Tinha vontade que você estivesse aqui e eu pudesse te mostrar muitas coisas, grandes, pequenas, e sem nenhuma importância, algumas. Fique feliz, fique bem feliz, fique bem claro, queira ser feliz. Você é muito lindo e eu tento te enviar a minha melhor vibração de axé. Mesmo que a gente se perca, não importa. Que tenha se transformado em passado antes de virar futuro. Mas que seja bom o que vier, para você, para mim.

ps: Ah esqueci Feliz Aniversário (19 anos!!!)...

Avesso

Chegar ao centro, sem partir-se em mil fragmentos pelo caminho. Completo, total. Sem deixar pedaço algum para trás.